Por Ana Vitória Sampaio*
No dia 05 de abril o pastor Silas Malafaia publicou um artigo um tanto tendencioso na Folha de São Paulo (clicar na imagens para ler o texto completo). Não há nada de diferente do discurso que Malafaia está acostumado a pronunciar, seja em seus cultos ou em seus programas de tv. Mais uma vez o pastor bate na tecla de que a homofobia só existe se um homossexual for assassinado ou agredido fisicamente. Se seguirmos a mesma linha de raciocínio, o machismo e o racismo também só existem quando uma mulher ou um negro sofrem violência física por serem quem são. Quando uma mulher é chamada de vadia ou burra pelo seu gênero, não deve ser considerado sexismo para Malafaia, apenas “liberdade de expressão”. Nem preciso dizer o quão ridícula é a explicação de que alguém não é racista por ter ascendência negra. Ser uma nação absolutamente miscigenada não impediu que a escravidão sobrevivesse por séculos, afinal, os mais bem sucedidos caçadores de escravos eram capitães do mato negros.
Religiosos fundamentalistas já aprenderam uma certa estratégia. Como na Constituição Federal de 1988 a liberdade religiosa é assegurada pelo art. 5º em que diz “VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”, estes alegam ter esse direito cerceado quando sua homofobia é questionada. Querem transformar os discriminados em discriminadores, afinal, pode-se falar absurdos contra gays, mas estes não podem se defender. Talvez seja essa a razão pela qual apresentem forte resistência em relação ao PLC. 122, afinal, uma vez que o projeto passar, a discriminação contra sexodiversos será punível, e tal disposição estará ao lado de crimes que violam a liberdade de crença.
Mas nem precisamos atacar a crença para sermos chamados de ditadores anti-religiosos gayzistas. Basta questionarmos a homofobia e outros tipos de atitudes discriminatórias. Em seu artigo, Malafaia parece jogar no lixo o diploma de psicólogo, uma vez que um profissional da área deveria saber o quão devastador é ouvir certas coisas, do contrário os consultórios estariam vazios. E sim, quando fundamentalistas comparam gays a pedófilos, zoófilos, necrófilos e viciados em drogas (Joelma que o diga), isso é altamente ofensivo. Mas não pensemos que Malafaia e os seus agem por ignorância. Talvez parte de seu público fiel sim, mas eles não. Sabem que incitam o ódio e declararam uma guerra para assegurar o direito de continuarem discriminando.
O pastor também ignora que os sexodiversos não foram os únicos ofendidos pelas declarações de Marco Feliciano. Mulheres, negros e seguidores de religiões afro-brasileiras também foram vítimas, como é possível comprovar em diversos vídeos e textos disponibilizados na internet. Malafaia quer passar a impressão de que apenas o ativismo LGBT está fazendo pressão no Congresso, esquecendo-se dos outros grupos discriminados. E, como não poderia ser diferente, o autor também coloca os nossos atos como uma forma de camuflar outros absurdos do cenário político brasileiro. Mais uma vez quem não faz nada vem cobrar de quem faz, decidindo o que é digno ou não de atenção.
A luta pela defesa do Estado Laico e dos direitos humanos não vai terminar enquanto os mesmos não forem respeitados da forma que merecem. A cada reunião da CDHM, estando aberta ou não ao povo – aquele que paga o salário de Feliciano, inclusive – estaremos presentes, munidos de nossos gritos de ordem e opinião, afinal, o direito à liberdade de expressão não está limitado ao local da fala dos pastores aos seus fiéis.
* Ana Vitória é historiadora e ativista. Atualmente está cursando mestrado em História na Universidade de Brasília, no qual trabalha com as discussões acerca da secularização do casamento e do divórcio no Brasil oitocentista.