Querido Henrique Eduardo Alves

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Sr. Henrique Eduardo Alves, não tenho mais Bíblia em casa, será que terei que comprar uma para conseguir entrar na Comissão de Direitos Humanos e Minorias, ou adquirir uma saia à altura dos joelhos basta? Cortei meus cabelos recentemente e tenho o desenho de um ser satânico – um elfo – tatuado no braço. Se eu pedir o perdão divino o pastor aceita a minha entrada na Comissão, ou terei que tirar minha tatuagem à laser? Sei que na Câmara Federal Marco Feliciano atua como deputado, mas a CDHM virou um culto evangélico e eu, como pessoa perdida aos olhos do Senhor, não sou bem vinda lá. Na última quarta-feira, 24/04, nem mesmo na Casa consegui entrar. Fiquei do lado de fora, jogada na calçada, disputando o pouco espaço à sombra que havia disponível com outros ativistas, e só entramos quando o deputado Domingos Dutra apareceu e nos resgatou – meus agradecimentos ETERNOS à ele!

Lá dentro encontrei os únicos militantes que conseguiram alcançar os sagrados corredores, antes das portarias se fecharem ao público – leia-se: às pessoas perdidas, com cara de “viado”, “sapatão” e “esquerdista” – e presidente, eles estavam feridos moralmente e fisicamente. Uma companheira foi ameaçada de agressão por um assessor que ela não conseguiu identificar, pois foi retirada antes de ter a oportunidade de reagir. O outro foi chamado de “viado” e convidado à “sair pra porrada” por um segurança.

Enquanto pessoas amontoavam-se do lado de fora e outras eram violentadas do lado de dentro, a CDHM recebia os evangélicos de braços abertos. Feliciano deu ordens para a polícia da Casa deixar as pessoas entrarem de acordo com os seus perfis. Uma medida, no mínimo, arbitrária. O único indivíduo contrário a Feliciano que conseguiu entrada na Comissão teve a boca fechada e foi retirado aos empurrões por se manifestar. O único espaço que tem se mostrado receptivo a nós é a Frente Parlamentar de Direitos Humanos, o único ponto de lucidez presente nesse Parlamento, tão omisso às necessidades do povo e tão fragilizado pelas suas bancadas baseadas em interesses pessoais e acordos políticos.

É por isso, Sr. presidente, que escrevo, que grito, que luto, que me revolto, que me arrisco e que me exponho. Porque não é só a cidadania que está ferida, é a laicidade do Estado que foi espancada, a partir do momento em que as portas se fecharam ao resto das pessoas e se abriram à uma pequena fração de evangélicos fundamentalistas. Perde a democracia, o Parlamento e a população brasileira, em favorecimento às vontades de um pastor/deputado que se julga maior que o próprio povo que diz representar.

Atenciosamente,

Ana Vitória.

Mulher, humana, brasileira.